"As metrópoles, ou cidades grandes, como queiram chamar. São verdadeiros amontoados de lixo! Onde todos passam para despejar seus restos, suas sobras, ou melhor, são nelas que todos passam e deixam seu pedacinho sujo."
... Semana passada eu estava sentada no café Royale quando chegou um grupo de trés pessoas. Provavelmente executivos, homens da alta. Entre eles haviam duas mulheres, duas biscates igualmente da alta, mas elas não ocupavam o mesmo podium que eles, mocinhos, senhores do mundo. Elas eram da alta, da alta sociedade de mulheres da vida. - Vadias.
Todos estavam bem trajados. Os homens despiram seus paletós e sentaram-se sem nem ao menos fazerem a cortesia de oferecer o lugar primeiro as senhoritas - Ah claro, elas não se importavam com isso.
Continuei tomando meu café com leite e chantili. Fazia um friozinho de fim de tarde eu estava muito bem agasalhada, e me detive a olhar para a mesa dos senhores.
Papo vai papo vem, beijinhos, sussurros; conversas totalmente baixas e cheias de segundas intenções.
Tentei imaginar a vida daqueles homens além café Royale em uma noite de inverno. Provavelmente pais de família. Chefões do mundo e da rasosite. E vejamos onde estavam agora.
Em um café, com mulheres do mundo. Por que?
Por que não com suas mulheres e com seus filhos no teatro do outro lado da rua? Ou talvez no Baltazares, um restaurante tradicionalíssimo do centro? Ou até mesmo em suas casas, na cabeceira da mesa á hora do jantar?
Por que? Por que ali, e com aquelas mulheres?
Eu sabia muito bem a resposta, afinal eu já tinha percorrido aquele caminho antes, eu já havia feito o que eles fazem agora, de outra forma claro. Mas eu já fui como eles.
A noite chegou rápido, ao contrário de sua partida.
Eu precisava ir embora para alimentar Peter, e em poucas horas a Magestri, como era chamada aquela cidade imunda, acordaria e tudo seria como realmente é.
Em poucas horas haveriam letreiros acessos convidando a todos que passassem nas ruas para uma noitada de orgias.
As luzes da avenida principal se mostrariam tentadoras. As ruas se encheriam de gritinhos abafados dos recém chegados, e claro, haveria as conversas mais despreocupadas de gente que já está ali a muito tempo.
Em meia hora veriam-se vestidos ao vento, corpos nus, insinuações vulgares. A noite de Magestri não é lugar para mim, uma mulher de meia idade, uma quase senhora.
Minha casa fica no fim da rua rimel, ao lado da antiga Casa Flet. Faço o mesmo caminho a cinco anos. Aceno para Jorge, um velho senhor que rega suas margaridas sempre as seis da tarde, pego minha correspondência ( contas á pagar) e entro no meu refúgio, no meu castelinho de areia.
Peter me lança aquele olhar de descaso -, Fome na verdade. Pobre do meu gato passou o dia todo com fome. Mentira! Eu o alimentei antes de sair.
Peter se enrosca por entre minhas pernas, meu filho, meu amigo. Meu gatinho faminto.
Deixo ele na cozinha, comendo seu enlatado. Minha casa é bem modesta, ela me é suficiente.
Subo minha adorada escada de caracol, lá em cima ficam meus maiores tesouros, meus registos, minhas lembranças.
Troquei as janelas do quarto de cima logo que me mudei. Mandei instalar janelões que pendem do teto até o chão, decorei-os com cortinas de cetim. No parapeito à almofadas, eu me sento por entre elas, arrasto um pouco a cortina e fico a bisbilhotar a vida lá fora...a noite de Magestri.
...
by. Arlan Souza.