sexta-feira, 23 de maio de 2014

Físico ou Abstrato - Parte 8


(imagem - google)

Ângela, venha até aqui Ângela. Isso garota, vem cá.
Me da a tua mão, isso... agora coloca ela aqui... isso garota, aperta com força.
- O que é isso? Onde eu estou?
Calminha Ângela, fica suave. Eu cuido de você.
Aperta essa porra ai vai, chupa ela sua vaca. Chupa todinha.
- Não, não por favor, por favor não, não... socorro... socorro... SOCOROOOOOO...

                                                                             ...

Eu forjei aquele estupro!
Quando Ângela parou de gritar eu fui chamar o Felipe e perguntei se ele sabia onde ela estava. Ele, como eu já esperava disse que não, que já fazia algum tempo que não a via. Sugeri que procurássemos pelos quartos e assim fomos abrindo porta a porta até que ele abriu a ultima, no fim do corredor.
Ângela estava lá. Deitada na cama, dopada e nua. Ricardo fumava ao lado.

Eu destrui o namoro de quase cinco anos entre os dois.
Felipe era um rapaz muito bom e facilmente manipulável. Naqueles dias eu fui seu ombro, ele ficou destruído com a cena que presenciou. Aos poucos eu o conquistei com mentiras, armações e doses bem altas de falso amor.
Nós nos casamos e nos mudamos para a Capital. Ângela continuou no interior, sozinha e em completo abandono. Enojada e afundada em vergonha de si mesma ela jamais contou para ninguém que tinha sido estuprada. Para todos, ela cedeu passivamente aos encantos de outro homem e assim traiu seu amado namorado. Pobre Ângela.
                                                                                ...

Os trabalhos de reconstrução haviam começado. O estranho noturno me dera um pedaço de papel com trés endereços e eu deveria visitar cada um deles na ordem exata em que foram escritos.
O primeiro era o número vinte e cinco de uma rua no interior da antiga cidade onde nasci. Quando li pela primeira vez não relacionei coisa alguma, mas entendi tudo quando cheguei lá. Era o endereço de Ângela! E foi naquele exato instante que eu compreendi o propósito de toda aquela perseguição. O estranho noturno me conhecia tão melhor quanto eu havia imaginado. E agora eu sabia o que ele realmente queria de mim.
Era uma vingança inversa!
 Eu deveria me punir. Eu precisava devolver tudo que roubei; a começar pela vida de Ângela.

Haviam se passado dez anos, e certamente muita coisa mudou. Descobri que Ângela acabou ficando grávida, e o pior, a criança não resistiu!  Ângela ficou estério e nunca se casou.
Eu permaneci fria, tentei não assimilar muito mais e nem pensar que a culpa de tudo aquilo era minha. Embora soubesse que o propósito real era exatamente esse. Fui calculista e me detive em fazer apenas o que o estranho me pedia.
                                                                                 ...

O segundo endereço era a rua Maria Antônia, 1801. A rua do colégio.
O meu relógio marcava seis e cinquenta, a primeira aula começaria em alguns minutos e sendo assim algumas dezenas de crianças corriam apreçadas para entrar na escola, exceto uma garota que estava encostada no muro e aparentava certo discuido consigo mesma. Magra e alta e com os cabelos despenteados. Quando todos entraram e o portão foi fechado ela atravessou a rua. Eu não pensei duas vezes e a segui. Alguma coisa me dizia que eu a conhecia e conhecia muito bem.
Ela não percebeu que estava sendo seguida, alguns metros a frente ascendeu um cigarrro e continuou andado. Um pouco mais a frente, antes que ela virasse a esquina eu não me contive.
- Catarina?! - A garota parou subitamente e se virou para me olhar. Me olhou confusa, com olhos de repreenção.
- Quem é você? Nós nos conhecemos? - antes que eu pudesse dizer qualquer coisa dois garotos dobraram a esquina em sentido contrário ao nosso, eles também estavam fumando.
- Ora ora, ai está ela - disse o mais alto. - Catarina! Ela continuou me olhando.
- Então moça, você me conhece? Por que ta chamando meu nome?
- Não! Eu não a conheço, me desculpe. Pensei que fosse minha filha. Perdoe-me. - a menina desviou o olhar sobre mim e se dirigiu aos meninos.
- Que bom que chegaram. Detesto gente maluca. Vamos embora!

Permaneci imóvel por um bom tempo, até que as lágrimas começaram a cair. Eu não estava maluca, ela era minha filha, minha caçula. Catarina!
                                                                                ...

Uma manhã cinza de segunda feira e tal como o endereço anterior, esse também tinha horário marcado. As dez e trinta, pontualmente em frente ao  Hospital São Miguel Arcanjo, avenida Benevides, 1000.
Eu fazia sentinela na entrada principal do hospital e olhava ansiosa para o outro lado da avenida.
Num frenesi de pessoas apresadas eu me detive em uma em especial. Uma médica pensei. A moça trajava avental branco e tinha os cabelos presos em um rabo de cavalo muitissímo elegante. Aguardava inquieta o sinal verde para atravessar e foi ai que toda aquela conjuntura me fez repentinamente ter o lampejo de uma lembrança antiga...

...médica mamãe, eu quero ser médica quando eu crescer...
...SENTA E POE O CINTO MARIANA OU VOCÊ VAI SE MACHUCAR GAROTA...

Fui trazida de volta pelo estampido da batida. A jovem médica estava no chão, caída sobre uma poça de sangue. Eu não pensei em mais nada e sai correndo, fui até lá e me joguei ao seu lado. Em seu jaleco pude ler o que eu já sabia. Mariana Martins, medica pediatra. Minha filha sangrava em meus braços; eu voltei para vê-la morrer.


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