domingo, 20 de julho de 2014

Quando o Coração dele virou Cinzas

                                          

Foi em uma madrugada fria lá em 2009 que eu encontrei sem querer o blog "Sobre Ninfas e Sátiros" e por ali fiquei durante algumas horas.
Me identifiquei com o que se escrevia ali; era doce e frio, triste também, mas aconchegante. Mais que isso, encontrei verdade naquelas palavras, e foi por isso que fiquei. Aos poucos fui visitando a página mais e mais, até que comecei a comentar as postagens e me lembro quando fui intrometido e pedi em um dos comentários para que a blogueira fizesse postagens mais frequentes,  foi ai que começou minha amizade a distância com ela.
Hoje trocamos visitas um ao blog do outro, e tenho tido a felicidade de estreitar distâncias através de palavras. 
Ariela é seu nome, o mundo é a sua casa e na fantasia ela reina absoluta.

Confesso que sempre quiz um texto dela aqui, porque tem magia naquilo que ela escreve.
O camaleão está honrado em recebe-la.
Ariela, minha amiga blogueira, seja bem vinda!

Apreciem.
                                                                    ...

Tudo começou longe. Óbvio. Paixões assim nunca acontecem por perto. Mas enfim, ele estava longe e ela também. Ele gostou dela, mas assim, só gostou. Mas ela meio que o esnobou.
Só que ela voltou. Achou ele por aí. E ele tinha gostado dela, lembra? Era um papo meio assim, meio sem contexto. Mas gostou.
Aí, um dia, numa festa sem pé nem cabeça, eles se encontraram, um sem querer meio por querer... Pronto, foi consumado.

Mas claro, a vida não podia ser legal com ele. Por que seria? Ele estava longe e chegou a hora de voltar.
Ele ficou meio triste, ela disse que estava também. Mas disse. Só disse. Porque era só isso que ela fazia, é só isso que ela sempre fez. Disse.
E ele foi embora. Assim mesmo, sem mais nada. Só foi. Mas foi irritado. Porque ele gostou dela. Só que agora ela tava longe e ele não. Ele estava realmente irritado, sabe? Porque ele não queria mais um amor perdido. Não era justo os amores dele sempre se perderem por aí, como se fosse a coisa mais natural do mundo.
Foi aí que ela decidiu voltar também. Não que ela viesse para perto, mas pelo menos não estaria mais tão longe, e talvez por, quem sabe, uns cinco segundos o coração dele bateu mais rápido. Ele ficou muito irritado. Não era para ele se apaixonar assim, não é assim que as coisas funcionam. Mas como lidar com as constantes aceleradas que o coração dele dava quando ela ia sem mais nem menos falar com ele? Como lidar? Ela dizia que gostava dele. Claro, como sempre, dizia, só dizia. Só que ele não, ele gostava mesmo dela, do seu jeito sarcástico e irônico, com o humor negro. Ele gostava, gostava demais.
Foi então que ele decidiu ter um daqueles cinco segundos de coragem insana e foi ver a menina. Assim, sem mais nem menos. Um belo dia mandou o "to indo aí te ver". Talvez, por outros cinco segundos, uma mera esperança tenha surgido nele. Talvez a vida não tivesse sido tão ruim com ele, talvez aquele não fosse um outro amor perdido. Quem sabe? Talvez estivesse na hora dele deixar de ser tão inseguro e desconfiado e passasse a confiar nas pessoas. Só um pouco. O que poderia dar errado afinal? Ela dizia que também gostava dele. Mas dizia, só dizia.
Enfim, ele foi, sem medo de ser feliz. E, de fato, a felicidade estava estampada na alma dele quando ele voltou. Não podia dizer que não tinha certas esperanças, mas não queria se apegar agora, não agora. Mas ela... ela dizia que tinha esperanças, ela dizia que tinha se apegado. Sempre dizia. Ela dizia que queria vê-lo de novo, que estava com saudades. Ele lutou, com todas as forças, mas como? Ela estava lá, dizendo que gostava dele!
Ele se sentiu mal. Se sentiu mal porque achava que a vida era ruim com ele por sempre tirar seus amores, mas agora que ela havia lhe dado um, ele ficava com graça.
Foi aí que ele decidiu se apaixonar. Simples assim. Se apaixonar enlouquecidamente, como se mais nada no mundo fosse importante. Ela deu o espaço, ele aproveitou. E eles se amaram, um pouco longe um do outro, mas se emaram. Só que por exato um mês.
E aí o coração dele partiu pela primeira vez.
A sensação que ele teve foi que haviam amarrado dez bigornas de ferro no corpo dele e o jogado no mar. Era exatamente a sensação de ver reflexos da superfície ao longe, enquanto se está no fundo, morrendo aos poucos, sufocando, sem ar, sem ar...
Sim, foi exatamente essa a sensação que ele teve.
Depois disso, ele simplesmente queria que a dor o consumisse de tal forma que ele morresse, tentava com todas as forças morrer de tristeza. Ele a odiava com todas as forças que tinha, mas a amava com todas as forças também.
Só que aí, ela apareceu! Quer dizer, reapareceu. Como se nada tivesse acontecido, dizendo que gostava dele, que estava com saudades, que queria vê-lo de novo.
Nem toda a irritação do mundo era tão grande quanto a dele e, sinceramente, só não era maior porque parte dele deixou de ficar irritado para ficar confuso. Ele queria dizer para ela que ela não prestava, que ela era uma vadia qualquer. Mas como? Ele pedia, implorava aos céus para saber como fazer isso. Ele não podia, não podia. Porque se ele falasse... ela nunca mais falaria com ele. Porque ela falava que gostava dele e ele gostava dela também. Ele não sabia o que fazer, não sabia. Simplesmente não sabia.
Então ele empurrou a situação, sempre respondendo, sempre se falando... e ela sempre dizendo o quanto gostava dele, o quanto estava com saudades, o quanto queria vê-lo de novo. E a cada dia, uma nova rachadura aparecia no coração dele. A cada dia a dor ficava mais funda. A cada dia... a cada dia.
Só que chegou uma hora que ele cansou. Ele estava lá sofrendo por uma causa perdida, mantendo uma coisa que o fazia mal. E só ele estava sofrendo. Só ele, mais ninguém. E decidiu superar e saiu espalhando o resto de amor que tinha em seu corpo por aí. Claro, que muitas lágrimas rolaram antes disso, mas era hora de superar, tinha que ser!
E sabe que ele estava conseguindo? Sabe que por uns dias ele parou de odiá-la? Por algum motivo ele tinha tomado uma decisão e todo o universo estava conspirando em favor dele. Ele se sentiu feliz. Ele não entendia, porque fazia tanto tempo que não se sentia plenamente feliz, que ele não conseguia entender o que estava acontecendo com ele. Parecia que nada no mundo, nem ela, seria capaz de tirar essa felicidade nele. Mas parecia, só parecia.
Porque agora era a vez dela. Assim, sem mais nem menos. Um belo dia mandou o "to indo aí te ver".
Foi como se ele tivesse morrido e ressuscitado cem vezes seguidas.
Ela iria ver ele? Por que? O que ela queria?
Ele não sabia.
Será que ela não sabia que tinha deixado o coração dele em pedaços? Será que não sabia que ele estava superando? Será?
Mas era bem o jeito dela, sabe? Aparecer assim de surpresa, com aqueles olhos sarcásticos, meio que sugerindo, que questionando. Mas ela dizia. Sempre dizia. Dizia que gostava dele e ele gostava dela também. Como duvidar de um sentimento que ele tinha também?
E ele acreditou, assim, simples assim. Acreditou porque gostava dela. Acreditou porque ela dizia. Mas ela só dizia, só dizia. Mas como não acreditar? O coração dele se recusara a partir de novo, ela estava indo vê-lo. ELA estava indo, como não acreditar?
E ela foi. E ele a viu. E ele lembrou poque era apaixonado por ela.
Desde então, eles não pararam de se amar. Não havia um minuto do dia que não se amassem. E daí que estavam um pouco longe? Nada mais era importante, nada mais. Enquanto eles se amassem. Mas ela dizia que gostava dele, mas só dizia, só dizia. E ela fez ele acreditar.
O problema é que vida definitivamente não era legal com ele: quando finalmente seu coração começou a se recuperar, quando finalmente esse lado da vida dele estava dando certo, a vida fez com que todas as outras partes dessem errado. Todos os sonhos, todas as esperanças tinham ido por água abaixo. Menos ela.
Nesse ponto, ele estava morrendo, todas as partes do corpo dele estavam morrendo, a vida o tinha feito morrer. A única coisa que sobrava daquele corpo era o coração, que ela insistia em segurar e manter inteiro, apesar de estar todo partido. O único motivo dele acordar todos os dias estava sendo ela dando vida ao coração dele, a única coisa que ainda estava viva em seu corpo. Ela dizia que gostava dele, que queria que ele ficasse bem, que queria vê-lo. E ele acreditava, porque ela tinha ido vê-lo, porque estava dando vida ao coração dele, porque ela era sua única e última esperança.
E ela deu vida ao coração dele, um pouco longe um do outro, mas deu. Só que por exato um mês.
De novo. Um mês. Só um mês.
Foi então que ela, mais uma vez, partiu o coração dele. Mas dessa vez foi diferente: ela partiu, moeu, pisou, destruiu e ateou fogo no coração dele. E o coração queimou. E o fogo foi consumindo cada parte, cada centímetro.
Até que ele virou cinzas. E ela o deixou lá, justamente quando ele precisava dela, justamente quando ela era a sua única esperança.
E ele morreu. Simples assim. Morreu.
Morreu sem entender. Morreu sem saber.
Só o que ele não sabia, é que existia uma força dentro dele, uma força que até hoje ele não sabe o que é. Que fez ele ressuscitar das cinzas. Não completamente, só algumas partes.
Mas essa nova vida estava repleta de dor. Uma dor insana e profunda, que não deixava ele viver, não deixava ele respirar. Era a dor de tê-la deixado fazer o seu coração virar cinzas. Dor de ter que seguir em frente. Dor.
Uma dor tão grande e extrema que o consumia. Toda sua força, toda a sua alma se resumiam em dor. Dor de ser um idiota. Dor de ainda ama-la. Dor.
Foi aí que ele a deixou ir. Deixou ela ir embora de dentro dele. Porque ele não aguentava mais, ele não aguentava. Ela não cabia mais dentro dele, então, por que mantê-la ali dentro?
Foi então que ela decidiu voltar para ele. De novo. Ela queria voltar, ela sempre tentava. Ela dizia que gostava dele. Dizia, só dizia, como sempre. Dizia que iria ajudá-lo. Dizia que não o faria mais mal. Mas dizia, só dizia. Como sempre.
Só que agora não tinha mais espaço para ela. Não tinha. Não mais.
Porque ela morava no coração dele.

E o coração dele tinha virado cinzas.



                                                                                                                     Ariela de Oliveira


(fotos: I am Dust, de Olivier Valsecchi)

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